Em
honra e glória a São Sebastião, valoroso padroeiro e defensor da cidade do Rio
de Janeiro e da nossa escola, o G.R.E.S. PARAÍSO DO TUIUTI tem a honra de
apresentar:
O SANTO E O REI: ENCANTARIAS DE
SEBASTIÃO
“Oh, meu rei de
fantástica memória
Passo a vida a
rezar tua história.
Tão verdadeira e
sobrenatural...
Eu rezo a tua
infância aventureira
Tua morte num
trágico areal.
Rezo a tua
existência transcendente
Numa ilha de
névoa, ao Sol nascente,
Encantada nos
longes da Natura...
E rezo tua vinda
anunciada,
Dentre as brumas
daquela madrugada
Que virá dissipar
a noite escura”
Oração
Sebastianista (Teixeira de Pascoaes)
I – O SANTO VENERÁVEL E O REI DESEJADO
Que venha Sebastião, O DESEJADO, assim nomeado por ser
a esperança de sucessão da dinastia que guiou o reino lusitano ao apogeu.
Que venha o divino rei-menino de Portugal, futuro regente
do Império Mundial Cristão!
MAJESTOSO, GUERREIRO, PUJANTE!
Que venha Sebastião, ornado de FESTAS DO POVO e de
JÚBILO DOS DEUSES. Cumpram-se todas as profecias, abram-se os livros da boa
aventurança.
O REI NASCEU! O REI NASCEU!
Na data mística de 20 de janeiro, Sebastião foi
ENCANTADO pelo espírito de coragem e fé do venerável Santo que lhe deu o nome.
Assim traçaram-se as flechas de bom e mau auguro sobre
DOM SEBASTIÃO.
O jovem Rei cresceu ouvindo as histórias de bravura e
martírio em nome da reconquista da Península Ibérica.
Um dia, conduziu seu exército rumo à última cruzada.
Marrocos era o destino. Vencer os mouros, uma
obsessão.
II – O REI ENCOBERTO
Em súplicas, Sebastião, o Rei, rogou proteção ao
padroeiro.
Sebastião, o Santo, concedeu-lhe coragem para
prosseguir: “Tua glória correrá muito além da própria vida. Irá se espalhar por
mundos e eras que nunca sonhaste”.
Fez-se então ungido com os paramentos banhados pelas
glórias dos antepassados.
E assim foi mapeada a incerta campanha. Era hora de
partir com a sua esquadra rumo a ALCÁCER QUIBIR.
Deu-se a sangrenta batalha no deserto do Norte
africano contra o exército do Sultão.
Destemidos, Santo e Rei empunharam a cruz contra a
cimitarra.
Postas frente a frente, tropas ergueram o pavilhão da
ordem de Cristo contra a bandeira da crescente lua e brilhante estrela.
Cavalarias avançaram-se em mortal conflito. Armas ao
céu, o rei se lançou à glória derradeira.
Nas areias do Marrocos, Dom Sebastião
desapareceu...
E veio o nevoeiro. Com ele, a esperança de que um dia
o Rei iria regressar para reviver o apogeu do seu povo.
“Ele há de voltar! Ele há de voltar...”
III – O REI SUBMERSO
E o Rei fez morada no mar...
Navegou em triunfo a bordo da nau mística com a tropa
que, com seu líder, sumiu no areal marroquino.
Aportou nas águas do Maranhão, em imponente cortejo
arrebatado.
Ergueu seus domínios na costa do Atlântico, indo tomar
lugar na corte dos encantados.
Com barbatanas bordadas de escamas cintilantes,
ascendeu ao régio trono marinho.
No suntuoso PALÁCIO DE CRISTAL, suas joias reais eram
cravejadas de pérolas, conchas e búzios.
Seu paraíso marinho era cercado de majestosos seres
encantados que habitavam o fundo do oceano.
A lenda do Rei submerso inundou o imaginário do povo
que vivia na beira do mar.
Na busca pelo Encoberto, foi o povo que se encantou em
névoa de maré...
IV – O REI ENCANTADO
Nas torrentes das águas sagradas, a lenda sobre o Rei
se espalhou.
Entre batuques vindos dos terreiros de mina se dizia
que, em noite de lua cheia, andava pela praia um TOURO NEGRO. E esse touro era
Dom Sebastião.
O bravo que se atrevesse a fincar uma espada reluzente
na testa do animal desfaria o encanto, cumprindo a profecia:
“REI / É REI DOM SEBASTIÃO / QUEM DESENCANTAR LENÇÓIS
/ BOTA ABAIXO O MARANHÃO”
Mas o desfazimento do encanto era em si outro encanto.
Assim, na crença, na magia e nos cânticos, o Rei foi
coroado no couro do tambor.
Dançou com os deuses, macerou as ervas e bebeu dos
segredos das matas. Incorporou-se aos cultos afro-ameríndios.
Entranhou-se, em alumbramento, na alma dos cantadores
e poetas populares.
Da sua capa real, ornada de brilho e sonho, veio a
inspiração para tecerem as vestes do bumba-meu-boi.
Encantado, Dom Sebastião se fez o espírito que o povo
desejava para conduzi-lo por novas cruzadas...
V – O REI DOS FLAGELADOS
Nos areais do sertão nordestino, o Rei Encoberto
regressou com o encanto de um monarca restaurador.
O povo, roto nas batalhas
de existir, nada esperava dos homens. Confiava tudo a um milagre de Deus.
Na busca pelo paraíso terreal, a crença dos sertanejos
esculpiu o espírito do Rei em alma de santo.
Na Serra do Rodeador, em Pernambuco, a insurreição se
deu. Mas foi esmagada pelo poder implacável da Coroa.
Anos mais tarde, na localidade da Pedra Bonita, em São
José do Belmonte, o beato João Antônio ocultou-se no alto da montanha com seu
séquito de flagelados.
Acreditavam que Dom Sebastião iria ressurgir das
fendas das pedras para restaurar a justiça social sempre prometida e nunca
alcançada.
Mas para isso era preciso lavar as rochas com sangue
para desencantar o Rei.
Houve nova batalha. O terror se espalhou no lajedo.
Morreu-se para não matar.
O Rei não veio. Ressurgiu n’outro arraial.
Em Canudos, Antônio Conselheiro liderou seu povo que o
seguia no limite entre a fé e o delírio messiânico, evocando a volta do
monarca.
“O SERTÃO VAI VIRAR MAR E HAVERÁ UMA GRANDE CHUVA DE
ESTRELAS”
Canudos, Pedra Bonita, Rodeador... tudo sucumbiu. Mas
não a glória do Santo-Rei Sebastião, que renasce ao poder do encanto de quem
nele acreditar.
VI – O SANTO PADROEIRO E O POVO-REI
LIBERTADOR
A cada episódio de luta e dor, eis a certeza de que o
espírito sebastianista continua a guiar o povo na eterna busca pelo seu próprio
rumo.
Dizem que o Rei vive adormecido nos domínios
encantados de São Sebastião, terra emergida a flecha e fogo.
A muy-heroica
cidade fundada durante o reinado de Sebastião, o Desejado.
Na data mística de 20 de janeiro, o nobre Estácio de
Sá foi flechado em batalha com os índios.
Conta a lenda que São Sebastião lutava ao seu lado.
O bravo guerreiro lusitano se encantou junto com sua
cidade, que um dia se partiu. E hoje se retalhou...
Recanto ferido, que precisa se regenerar.
Mas um dia há de vir o verdadeiro Rei.
Que das brumas da memória se levanta e se ergue
MAJESTOSO, GUERREIRO, PUJANTE!
É o POVO, senhor de si, enfim desencantado
Que na bravura do Rei por ele mesmo despertado,
Arrancará as flechas do peito do padroeiro
E Sebastião, enfim, há de restaurar o que lhe é
devido:
O trono do Rei e o altar do Santo.
E a paz enfim triunfará
Na cidade cansada de tantas batalhas...
Mas nunca da luta!
(Ele há de vir. Ele há de vir...)
Carnavalesco:
João Vitor Araújo
Texto:
João Gustavo Melo
Inspirado
no poema “O Rei que Mora no Mar”, de Ferreira Gullar e nas encantarias e
brasilidades de Luiz Antônio Simas.
REFERÊNCIAS:
FERRETI, Sérgio F. Encantaria maranhense de Dom Sebastião. Lisboa: Revista Lusófona de Estudos Culturais. Vol. 1, n.1, pp. 108-125, 2013.
GULLAR, Ferreira. O
Rei que mora no mar. São Paulo: Global Editora, 2002.
MARINHO, Luisa. Desencanto.
Rio de Janeiro: Funarte, 2015.
RORIZ, Aydano. O
Desejado: a fascinante história de Dom Sebastião. São Paulo: Editora
Europa, 2015.
SIMAS, Luiz Antônio. Almanaque brasilidades: um inventário do Brasil popular. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2018.
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