“Nzungu – O Quilombo
Negro de Resistência, vamos fazer barulho de preto na Avenida!”
Rio de Janeiro, Largo do Peixe, início do século XIX, ao lado do Paço
Imperial, as mulheres pretas nessa época, também conhecidas com quituteiras,
eram negras libertas ou “escravas de ganho” que montavam suas quitandas e
vendiam o famoso angu. Como até os dia de hoje, o prato do angu era um alimento
popular feito com milho moído, cozido e temperado, por vezes complementado com
carnes e camarão.
Essas pequenas quitandas ou barracas eram fixas. Com elas existia a
sociabilidade entre escravos, ex-escravos e também alguns libertos. Esses
locais ganharam uma tradução yorubá e ficaram bastante populares nesse período
como nzungus.
Mais tarde, quando conseguiram algum dinheiro, as baianas quituteiras se
mudaram para as casas e começaram a cozinhar o alimento dentro delas, situadas
em pequenas ruas da cidade, principalmente nos bairros do Centro e da Gamboa.
Ali, todos se reuniam para dançar, batucar, cantar, celebrar e reverenciar os
seus orixás, inquices e voduns. Dessa forma, os nzungus ganham força e se
tornam sede de resistência cultural dos negros. As casas começam a receber a
adesão dos escravos fugidos (muitos do recôncavo baiano) e africanos
recém-chegados, fazendo daquela região do rio uma cidade escondida, a pequena
África - um verdadeiro quilombo.
Nessa época, esses nzungus começam a ser chamados de “barulho dos
negros” ou “barulho de pretos”. Em 1835, o governo cria uma lei para proibir e
reprimir tais encontros. Logo os locais foram vistos como clandestinos, lugar
de lúgubres, imundos, ponto de reunião de desordeiros, vagabundos, gatunos pela
sociedade. A polícia recriminava e chamava os znungus de “Casas de Quilombo” e
perseguiam esses encontros pela Rua da Vala, no Beco do Cotovelo e na Rua do
Lavradio. Na Gamboa, a proibição era grande, mas tinham também o apoio de alguns
comerciantes e pessoas que acreditavam que ali, ainda era um ponto de
resistência e a existência de um espaço como esse era fundamental para o
funcionamento da cidade, pois movimentava o comércio da região.
Os nzungus, que eram na sua maioria comandado por mulheres negras ou
libertos minas, começam a se solidificar como verdadeiros centros quilombolas e
principal referência para se propagar a cultura urbana negra brasileira. Ali, o
povo negro que foi separado da sua família original, cria novas famílias, novos
amigos e novos afetos. No local, a música, a dança o jogo de capoeira eram
formas de trocar informação e manter acessa à história do povo africano.
Eram centros de luta, casa de liberdade, espaço de tradição africana e
brasileira negra. Uma rede familiar de irmãos. Centro onde as vozes não se
calam, os gritos ecoavam de felicidade. Quilombos da cidade do Rio de Janeiro,
Nzungus - espaço de cultura e força africana.
Nesse carnaval, o Jacarezinho, nossa favela amada, se torna um Nzungu,
um verdadeiro quilombo cultural. Nesse dia, nosso samba será cantado e
propagaremos um grito de resistência: Vamos cantar o amor, a nossa voz cantará
a nossa cor, a nossa cultura e a nossa existência. Dançaremos para os nossos
orixás e lutaremos até o fim para que não calem as nossas vozes!
Nessa data de folia, nosso Jacarezinho se veste com as cores d`África,
pinta seu rosto de guerreiro e batuca seu atabaque chamando todos os seus
ancestrais para a luta na avenida.
Será uma luta pacífica, de oportunidades, de sociabilidade e de
visibilidade negra nesse espaço cultural que é o carnaval carioca. Lutaremos
para vitória, para alçarmos o nosso lugar no topo, no lugar de onde jamais
deveriam ter nos tirado, no nosso lugar de ocupação e de visibilidade, dessa
que é maior comunidade negra da América Latina. Hoje, nossa favela é o Nzungu –
O Quilombo Negro de Resistência, vamos fazer barulho de preto na avenida!
Autores do Enredo: Edu Gonçalves e Igor Damásio
Fontes Bibliográficas: MARTINS, Valter. Taguás: simulacros da
liberdade no últimos anos da escravidão em Campinas. XXIV Simpósio
Nacional de História – ANPUH, 2007. SOARES, Carlos Eugênio Líbano. Zungú:
rumor de muitas vozes. Rio de Janeiro: Arquivo Público do Estado do Rio
de Janeiro, 1998.
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